quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Livros para a FUVEST 2014

Com alteração de quatro obras, nova lista será cobrada nos próximos três anos
A Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp (Comvest) e a Fuvest estão divulgando a lista unificada de obras literárias que serão abordadas nos próximos vestibulares: 2013, 2014 e 2015. A lista tem nove obras e já está disponível os resumos aqui. Em relação à anterior, a lista tem quatro alterações. As novas obras incluídas estão destacadas abaixo em negrito.
A Unicamp exige dos candidatos a leitura prévia e completa do texto integral das nove obras indicadas:
  • Viagens na minha terra – Almeida Garrett;
  • Til – José de Alencar;
  • Memórias de um sargento de milícias – Manuel Antônio de Almeida;
  • Memórias póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis;
  • O cortiço - Aluísio Azevedo;
  • A cidade e as serras - Eça de Queirós;
  • Vidas secas - Graciliano Ramos;
  • Capitães da areia – Jorge Amado;
  • Sentimento do mundo – Carlos Drummond de Andrade.
Na nova relação, deixaram de constar as seguintes obras indicadas nos vestibulares anteriores: Auto da barca do inferno – Gil Vicente, Iracema – José de Alencar, Dom Casmurro – Machado de Assis e Antologia poética – Vinícius de Moraes.


COMENTÁRIOS E RESUMOS DOS LIVROS:


Memórias de um sargento de milícias -  Manuel Antônio de Almeida

"Memórias de um Sargento de Milícias", de Manuel Antônio de Almeida, foi lançado originalmente sob a forma de folhetim, em "A Pacotilha" - o suplemento literário do jornal "Correio Mercantil", do Rio de Janeiro, entre 27 de junho de 1852 e 31 de julho de 1853. Só nos dois anos seguintes se transformaria num livro, publicado em dois volumes. Divertido, o romance mostra a vida da "baixa sociedade" no Rio antigo.

Esse romance merece destaque e ocupa um lugar ímpar na história da literatura brasileira, na medida em que se distancia muito dos modelos românticos que prevaleciam na época de sua publicação: a visão de mundo que ele expressa não é marcada por traços idealizados e sentimentalistas. Ao contrário, o autor se vale de um estilo objetivo e realista, semelhante ao das crônicas históricas e de costumes.

Isso pode ser visto desde as primeiras linhas do texto, onde o jovem Manuel Antônio, que tinha 21 anos ao escrevê-lo, faz questão de deixar claros a data ("Era no tempo do rei." - no caso, dom João 6o) e o local ("Uma das quatro esquinas que formam as Ruas do Ouvidor e da Quitanda [...]" - no centro do Rio de Janeiro) onde sua história vai se desenrolar.

Tipos populares
Além desse caráter realista, entretanto, o romance põe em foco, com traços caricaturais, os tipos populares, a "arraia miúda", do Rio de então. A sociedade brasileira (que mal começava a se esboçar naquele momento) é vista pela perspectiva dos pobres, ao contrário do que acontece nas obras de Joaquim Manuel de Macedo ou dos romances urbanos de José de Alencar.

Tendo como personagem principal um anti-herói, que se chama Leonardo, "Memórias de um Sargento de Milícias" relata seus esforços para driblar as adversidades de sua condição social e, ao mesmo tempo, se aproveitar ao máximo dos intervalos de sorte que tem na vida. São esses os mesmos motivos que impelem a grande maioria das personagens do romance.

Romance picaresco
Nesse sentido, "Memórias de um Sargento de Milícias" se filia à tradição do romance picaresco, que se origina na Espanha, com a publicação de "Lazarillo de Tormes", de 1554. A expressão "pícaro" refere-se "àqueles que vivem de astúcias, ardis, trapaças" e, nesse sentido, deu origem a um dos sentidos da palavra "picareta", muito usada ainda hoje. O pícaro ou picareta se vale desses expedientes para garantir sua sobrevivência e tem, com toda certeza, uma visão cínica da realidade que o cerca.

É precisamente o caso de Leonardo, enjeitado pelos pais pouco depois do nascimento, criado pelo padrinho e, depois, pela madrinha, ele logo dá mostras de seu verdadeiro caráter. O romance narra suas aventuras e desventuras na "baixa sociedade" fluminense, até que ele é preso pelo Major Vidigal - um personagem que existiu mesmo: Miguel Nunes Vidigal, chefe da Guarda Real, criada pelo rei em 1809, para policiar o Rio de Janeiro.

Jeitinho brasileiro
O Vidigal é o símbolo da repressão arbitrária e socialmente injusta, temida por todos aqueles que - tenham ou não problemas com a lei - são pobres e não dispõem de recursos, nem contam com a amizade de algum poderoso que eventualmente possa ampará-los num momento de necessidade.

Enfim, o que não falta são reviravoltas à narrativa de "Memórias de um Sargento de Milícias" e, graças a intervenção da madrinha de Leonardo e de uma amiga sua - ex-amante do major Vidigal - o anti-herói acaba por ingressar na milícia e ser promovido ao cargo de sargento a que se refere o título.

Vale insistir no valor documental e sociológico do romance e lembrar que se trata de uma narrativa divertida e bem-humorada, que ainda hoje pode fazer o leitor passar alguns momentos muito agradáveis, enquanto se prepara para uma prova na escola ou mesmo para o vestibular.


Til - José de Alencar


Romancista, jornalista, político, advogado, orador, crítico, cronista, polemista e dramaturgo, José de Alencar (Messejana, CE, 1829 – Rio de Janeiro, 1877) formou-se em Direito e iniciou a atividade literária no “Correio Mercantil” e “Diário do Rio de Janeiro”.
Til, escrito em 1872, pertence à fase regionalista da obra do autor, que inclui ainda livros como O gaúchoO sertanejo e Tronco do ipê. Essas obras têm alguns elementos comuns, como retratar os costumes, a linguagem e a vida rural do século XIX. Também apresentam características românticas, como a idealização da natureza, a subjetividade e os enredos românticos.
Os protagonistas são Berta, Miguel, Linda e Afonso. Numa fazenda do interior paulista, segredos, desencontros amorosos e renúncias integram o enredo, bem dentro dos paradigmas do romantismo. Basta verificar a forma como alguns personagens são construídos.
A história gira em torno de paixões. Linda e Afonso são irmãos gêmeos, filhos de Luís Galvão e Dona Ermelinda. Linda ama Miguel, e Berta e Miguel se amam, mas, para que a amiga Linda não sofra, Berta consegue que Miguel se apaixone por Linda. Trata-se de uma estrutura narrativa em que os sentimentos comandam as ações.
Outro exemplo está na história de vida de Berta. De bom coração, ela visitava constantemente Zana, uma mulher com problemas mentais. O menino Brás, porém, também com alguma deficiência, sente ciúmes da protagonista e tenta matá-la. Repreendido pela heroína, arrepende-se.
O leitor fica sabendo que Brás era filho de uma irmã de Luís Galvão, que morrera viúva, e, por isso, ele vivia na casa de seu tio. Ele dera ainda a Berta o apelido de Til, pois, quando ela lhe ensinou o alfabeto, ele achou o til um sinal “gracioso”, associando-o a ela.
As rocambolescas ações do livro têm outros pontos altos. Um deles é quando Luís Galvão revela ser o pai de Berta com Besita, a moça mais bonita da cidade a quem ele seduziu e por quem Jão Fera, matador profissional, estava apaixonado em vão. Ele, porém, a pedido de Berta, se compromete a não cometer mais atos violentos e passa a trabalhar no campo.
Nhá Tudinha, mãe de Miguel, por sua vez, adota Berta como sua filha. Luís, no entanto, pede a Berta que vá morar com ele e sua família em São Paulo, mas ela se nega e pede que leve Miguel, apaixonado por Linda. Miguel tenta convencê-la a ir junto, mas ela recusa, ficando no interior. Bem ao estilo romântico, declara: “Não, Miguel. Lá todos são felizes! Meu lugar é aqui, onde todos sofrem.”
A narrativa é conduzida com leveza ao gosto dos sentimentos dos quatro adolescentes. Eles mudam pouco ao longo da história, o único que altera seu comportamento, graças à boa influência da protagonista, é Jão Fera. Os episódios vão se acumulando sem grandes tragédias, embora sempre pareça que elas vão acontecer. O ponto mais forte é a valorização do interior do país e da vida bucólica como respostas a um país onde as cidades já começavam a ganhar maior importância.
A cidade e as serras - Eça de Queirós

Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação
Este último romance de Eça de Queirós foi publicado em 1901, um ano após sua morte. Retirado do conto "Civilização", tem sido considerado, junto com as obras "A Ilustre Casa de Ramires" e "Correspondência de Fradique Mendes", uma trilogia, cujo ponto comum é a crítica ao ambiente social e urbano de Portugal.

Como o próprio nome da obra revela (a cidade se opõe ao campo), pretende criticar o progresso técnico, urgente e rápido, na virada do século 19 para o 20. Eça de Queirós julgava, ao fim da vida, que o homem só era feliz longe da civilização. Por isso, a temática mais forte da obra é contra a ociosidade dos que têm dinheiro na cidade, e sua vida burguesa, ou seja, o acúmulo irrefletido de dinheiro.

Um interessante foco narrativo

Dizem os críticos que neste romance Eça aproveita para fazer seus personagens "olharem" as imagens que ele mesmo via quando criança. É um bucolismo romântico que volta e contamina seu romance. Na verdade, porém, quem conta a história e as aventuras por que passa o personagem principal, Jacinto Galião, é um amigo seu, José Fernandes, que também está na história, mas sente-se menos ilustre que Jacinto, herdeiro rico e personagem central de crítica de Eça de Queirós à riqueza. 

O romance começa assim: 

"O meu amigo Jacinto nasceu num palácio, com cento e nove contos de renda em terras de semeadura, de vinhedo, de cortiça e de olival".

Esse foco narrativo (ou seja, essa maneira de contar a história) tem um nome técnico, "eu-como-testemunha", e é muito apropriado para obras que desejam ser críticas, pois o personagem-narrador acompanhará o protagonista em suas aventuras; e, como contará a história tempos depois, pode ser bem crítico e analisar melhor o que aconteceu. No caso, o apego de Fernandes ao protagonista tem ainda outra razão: este narrador quer entender o que faz um homem rico (nascido em Paris, capital da França) trocar tudo pelo campo, no interior de Portugal. 

Enredo: a vida fácil no campo

Embora muito inteligente e capaz, Jacinto vive do dinheiro herdado da família. Desde pequeno tudo dava certo em sua vida. Já adulto, elegante e culto, parece achar que os males humanos seriam curados com a volta das pessoas à vida no campo. 

É muito fácil pensar assim, quando, tendo muito dinheiro, não se precisa plantar, nem colher, nem viver as privações do trabalho agrícola. Há, portanto, um moralismo simplificador nesta obra, que faz com que alguns críticos julguem o personagem um pouco tolo, e Eça de Queirós um tanto superficial.

De início, a maior preocupação de Jacinto era defender o progresso, a civilização e a cidade grande. Achava ele que ser civilizado era enxergar adiante, ver o futuro. José Fernandes (narrador e seu amigo) fica espantado quando reencontra Jacinto em Paris, em sua mansão na Avenida Campos Elísios (Les Champs Elysées), número 202. Há todo o tipo de modernidade e luxo, além de uma biblioteca com milhares de títulos dos principais escritores e cientistas do mundo. 

Convidado por Jacinto a morar em Paris, o narrador percebe (e nos conta) que Jacinto vai-se decepcionando com a superficialidade das pessoas com quem convive. Ele passa a conviver mal com o barulho da cidade, com o movimento e burburinho das pessoas em festas e reuniões e com a tecnologia, que sempre o deixa na mão.

A ida para o campo

Os incidentes da vida moderna davam, na verdade, tédio em Jacinto. Seu criado fiel, Grilo, conta ao narrador que o mal de seu patrão "era fartura". "O meu Príncipe sente abafadamente a fartura de Paris...", diz ele. Jacinto, numa mudança existencial, passou a achar que Paris era uma ilusão, tudo era abafado e não havia grandeza na cidade: comerciantes, cortesãs, famílias desagregadas era a única realidade. Começa a filosofar, e o narrador nos conta o que ele dizia: "o burguês triunfa, muito forte, todo endurecido no pecado - e contra ele são impotentes os prantos dos humanitários..."

Um dia Jacinto decide: mudará para Tormes, sua propriedade rural, onde seus avós estavam enterrados. Ambos os amigos partem então de Paris para as serras. Nosso narrador ainda diz que Jacinto afirmava que "encontrariam o 202 no interior", contando, é claro, com o conforto daquela propriedade, um castelo.

As coisas não dão tão certo: o advogado do milionário não o esperava chegar tão cedo, as malas da viagem ficaram perdidas e os dois amigos ficaram a pé para atravessar a serra. Pior: ninguém da casa sabia que eles viriam. Por isso não havia conforto, nada estava preparado.

O milagre da comida caseira

Irritado, sem saber viver sem conforto, Jacinto afirmou que iria a Lisboa. MasMelchior, o caseiro, arranjou-lhes uma comida simples, sem taças de cristal nem porcelana. Começa a mudança do protagonista: "Diante do louro frango assado no espeto e da salada (...) a que apetecera na horta, agora temperada com um azeite da serra digno dos lábios de Platão, terminou por bradar: 'É divino'."

Apaixonado pela nova vida, o dono da mansão do "202" em Paris ficará em Tormes, mesmo sozinho, pois seu amigo, o narrador, havia partido para outra cidade. Intrigado com essa espantosa decisão do amigo, José Fernandes volta a visitá-lo e o encontra forte, corado, "parecia um camponês".

O campo muda o homem

Conhecendo a pobreza que há nos campos, Jacinto começa a cuidar dos humildes. Queria fazer benfeitorias, trazer certa "civilização" ao interior de Portugal. Numa das festas desse mundo interiorano, conheceremos também a ignorância e o atraso em que viviam os camponeses. Havia (nos conta o narrador) uma "mentalidade política atrasada, absolutista", enquanto nas cidades havia novas doutrinas e teorias (como o positivismo, com o qual simpatizavam ambos, Jacinto e José Fernandes).

Numa das visitas à família do amigo, Jacinto conhecerá a prima de Fernandes, Joaninha, uma camponesa típica. Apaixonado, o rico rapaz acaba casando-se com ela, tem dois filhos sadios e alegres. Depois de cinco anos de felicidade, o dilema existencial entre a "cidade e as serras" se resolverá, finalmente, pois chegarão à fazenda os caixotes antes embarcados em Paris e perdidos há anos. Jacinto aproveitará muito poucodo que há de "civilização" nas malas.

E o narrador, depois de passar mais algum tempo em Paris, volta ao campo definitivamente, convencido de que Jacinto estava certo: era bem melhor a vida no campo.

O livro termina desta forma: 

"E na verdade me parecia que, por aqueles caminhos, através da natureza campestre e mansa - o meu Príncipe (..), a minha prima Joaninha (...) e eu (...), tão longe de amarguradas ilusões e de falsas delícias (...), seguramente subíamos para o Castelo da Grã-Ventura."


Memórias póstumas de Brás cubas - Machado de Assis


Para o conceituado crítico literário americano Harold Bloom, Machado de Assis(1839-1908) é um dos 100 maiores escritores da literatura de todos os tempos. Tal afirmação dá uma dimensão de como o escritor carioca é um dos poucos autores nacionais a ultrapassar as fronteiras impostas pela língua portuguesa em termos de reconhecimento internacional.

Esse prestígio deve-se, em boa parte, ao resultado estético da sua segunda fase literária, vinculada ao realismo e iniciada justamente com "Memórias Póstumas de Brás Cubas", em 1881. A obra foi seguramente a mais radical experimentação da prosa brasileira até aquele momento.

O tom diferenciador começa na própria escolha do narrador, um defunto, chamado Brás Cubas. Ao rever a sua existência, ironiza sobre a falta de sentido da vida. A história contada é bem menos importante do que os recursos linguísticos apresentados, com um narrador que diz que capítulos podem ser pulados ou lidos fora de ordem.
Mundo interior
Em seus romances ligados ao romantismo Machado não foge às convenções do gênero, embora com menos exageros que os seus contemporâneos. Nas suas criações realistas, porém, a preocupação não está na sociedade brasileira especificamente, mas sim na busca de temáticas universais, que mostrem a fragilidade humana diante das mais variadas situações, como o amor, a vida e a morte.

Ao contrário do romantismo, os personagens e as paisagens não são importantes. O centro das atenções é a maneira de contar a história e a forma como a realidade é vista. O mundo interior dos personagens é trazido para o primeiro plano. Isso ocorre em 145 capítulos curtos, alguns célebres, como o 7o, intitulado "O Delírio".

Brás Cubas conta a sua história a partir da morte, do final para o começo, amargurado por ter passado pela vida com dinheiro, mas sem aquilo que mais desejava: o reconhecimento público. No amor, também havia sido rejeitado. Virgília, presente em seu enterro, o trocara por Lobo Neves, mas depois fora sua amante.
Hipocrisia e ironia
Instaura-se, assim, o tema da hipocrisia, constante na prosa machadiana. Aos 17 anos, por exemplo, Brás conhece Marcela, prostituta espanhola radicada no Rio de Janeiro, a quem enche de presentes com o dinheiro paterno. Indignado com a descoberta de que seu dinheiro estava sendo usado com esse fim, o pai envia o protagonista para estudar na Europa, de onde retorna bacharel. Anos mais tarde, reencontra Marcela, desgastada pelo tempo implacável, dona de uma pequena loja e com o rosto marcado pela varíola.

Infeliz, Brás sonhava alcançar a fama pela invenção de um "emplasto anti-hipocondríaco, destinado a aliviar a nossa melancólica humanidade". Consegue apenas mais um fracasso para a sua coleção de insucessos, ironizados na própria dedicatória do livro: "Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico com saudosa lembrança estas Memórias Póstumas".

No último capítulo, significativamente chamado "Das Negativas", existe um balanço, claramente negativo da passagem pela vida, que termina com a famosa afirmação "Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria". Trata-se de uma afirmação forte, escrita por um irônico narrador, como o próprio Machado, conhecido como o Bruxo de Cosme Velho, pelo seu mágico poder de lidar com as palavras.
Capitães da Areia - Jorge Amado


Publicado em 1937, Capitães da Areia é o sexto romance de Jorge Amado, um dos mais famosos e traduzidos escritores brasileiros do século 20. No prefácio ao livro, escreve o romancista que, com essa obra, encerra o ciclo de "os romances da Bahia".

A narrativa, de cunho realista, gira em torno das peripécias de um grupo de "meninos de rua" que sobrevive de furtos e pequenas trapaças. Por viverem em um trapiche velho e abandonado (uma espécie de armazém à beira do cais), os garotos do bando, liderados por Pedro Bala, são conhecidos pela má fama de "capitães da areia". É lá, no trapiche abandonado, que Pedro Bala, órfão, (o pai foi morto à bala por liderar uma greve, daí a alcunha do garoto, enquanto a mãe tem o paradeiro desconhecido) se refugia com seu grupo.

A história é conduzida em função dos destinos individuais de cada integrante do bando. Assim, Jorge Amado ilustra a marginalização definitiva de uns (por exemplo: Sem-Pernas e Volta Seca) e a desalienação de outros, como Professor, Pirulito e Pedro Bala. Este, tomando consciência das injustiças sociais, ao final do romance, torna-se líder (tal como o pai), lutando ao lado dos trabalhadores grevistas. Pirulito, devido à vocação, descrita desde o início do romance, torna-se frade capuchinho, justificando a incansável luta de padre José Pedro em resgatar aqueles jovens da marginalidade. Padre José Pedro é uma das poucas personagens adultas, juntamente com a mãe-de-santo Don'Aninha, a se aproximar do grupo marginalizado.

Apresentação de algumas personagens

A personagem Pedro Bala é apresentada da seguinte forma pelo narrador: "É aqui também que mora o chefe dos Capitães da Areia Pedro Bala. Desde cedo foi chamado assim, desde seus cinco anos. Hoje tem 15 anos. Há dez que vagabundeia nas ruas da Bahia. Nunca soube de sua mãe, seu pai morrera de um balaço. Ele ficou sozinho e empregou anos em conhecer a cidade. Hoje sabe de todas as suas ruas e de todos os seus becos" (p. 21). Era loiro, 15 anos, tinha um talho no rosto, provocado por uma briga com o antigo chefe do bando, Raimundo, na disputa pela sua liderança. E, apesar de não participar de todas as cenas, Pedro Bala irá servir como linha condutora de toda a história, dando um caráter coesivo aos diversos quadros que são apresentados ao longo da narrativa.

O grupo liderado por Pedro Bala beirava o número de cem e era composto por:
  • João Grande, o "negro bom", nos dizeres do próprio Pedro Bala: "Engajou com 9 anos nos Capitães da Areia, quando o Caboclo ainda era o chefe e o grupo pouco conhecido, pois o Caboclo não gostava de se arriscar. Cedo João Grande se fez um dos chefes" (p. 23);
  • Volta Seca, que tinha ódio das autoridades e o desejo de se tornar cangaceiro (posteriormente integra-se ao grupo de Lampião, transformando-se em um frio e sanguinário assassino);
  • Professor, que recebe este apelido por gostar de ler e desenhar. Assim o narrador o apresenta: "João José, o Professor, desde o dia em que furtara um livro de histórias numa estante de uma casa da Barra, se tomara perito nestes furtos. Nunca, porém, vendia os livros, que ia empilhando num canto do trapiche, sob tijolos, para que os ratos não os roessem. Lia-os todos numa ânsia que era quase febre" (p. 25).
  • Gato, sujeito conquistador, vive entre as prostitutas, com seu jeito malandro atrai uma delas: Dalva;
  • Sem-Pernas, garoto deficiente de uma perna, que serve de espião para o grupo. Fazia-se de órfão desamparado para ser acolhido pelas famílias e, assim, com a confiança destas, conhecia cada ponto estratégico de suas residências, retransmitindo tais informações ao grupo. É em uma dessas casas que Sem-Pernas é bem acolhido por um casal que perdera o filho pequeno. Nesse episódio a personagem vive um grande conflito: sente remorsos por ter de roubar aqueles que lhe acolheram com a um filho, ficando, dessa forma, dividido entre passar as informações da casa para os companheiros e ser leal à família. Decide-se por manter-se fiel aos "Capitães da Areia";
  • Pirulito, "magro e muito alto, uma cara seca, meio amarelada, os olhos encovados e fundos, a boca rasgada e pouco risonha" (p. 28). Era o único do grupo que tinha vocação religiosa, embora pertencesse aos Capitães da Areia;
  • Dora, a única mulher do grupo, tinha quatorze anos, era muito simples, dócil e bonita. Representará para os Capitães da Areia a figura da madre protetora, que dará colo, carinho e atenção, e também, a figura da irmã que para eles até então inexistia. Já para Pedro Bala, Dora será a "noiva" e a "esposa". Morre ardendo em febre e seu corpo é levado ao mar, onde será "sepultado" com a ajuda de padre José Pedro, que, mais uma vez indo contra a lei e a moral estabelecidas, decide ajudar os meninos do Trapiche. Dora será uma personagem de fundamental importância na construção da lógica do romance. Será por sua causa que Pedro Bala, apaixonado, iniciará sua transformação e tomada de consciência rumo à ação política e.social.
 O emprego metonímico para a apresentação das personagens
Uma forma bastante usual nas narrativas é o narrador apresentar as personagens por meio da descrição de suas características físicas e psicológicas. E nisso, como pudemos ver acima, o romance de Jorge Amado vale-se da metonímia, figura de linguagem que consiste em tomar a parte para representar o todo.

Devido a esse recurso estilístico, temos a impressão de que "a qualidade ou o defeito principal de cada personagem se estendesse e dominasse todo o indivíduo, servindo-lhe de emblema e, em muitos casos, determinando-lhe toda a ação", conforme afirma o prof. Álvaro Cardoso Gomes (em Roteiro de Leitura: Capitães da Areia, Ática, 1996).
Estrutura da narrativa
O romance é divido em três partes, que são subdivididas em capítulos de variadas extensões, ora longos, ora curtos. O prólogo "Cartas à Redação" precede às partes subdivididas do romance. Com ele, o autor cria um artifício que nos leva a acreditar na veracidade dos fatos que a voz, em terceira pessoa, irá narrar sobre os "capitães da areia".

Esse recurso utilizado por Jorge Amado trata-se de um expediente bastante comum e antigo ao gênero romance - que remonta ao início do Romantismo, período em que o gênero será delineado na sua forma moderna e, praticamente, obtém alcance mundial -, de modo que era bastante usual iniciar a narrativa pela afirmação de que a história era a transcrição de um velho manuscrito.

No caso da obra do autor baiano, trata-se de um recurso de caráter missivista-jornalístico, em que aparece uma sucessão de cartas dirigidas à redação do Jornal da Tarde, após a publicação, por parte deste, de uma reportagem em que tratava do assalto das crianças à casa de um abastado comerciante de um dos bairros mais ricos da cidade. Tal expediente - o das cartas e reportagens - , fornece à história um alto grau de verossimilhança. Na segunda parte do romance, por exemplo, o narrador, de forma indireta, nos dá notícia do destino de algumas personagens por meio de reportagens.

O clímax da primeira parte do romance é dividido em dois momentos. O primeiro dá-se quando os meninos se envolvem com um carrossel mambembe que chegou à cidade, deixando em evidência a verdadeira condição de cada um deles, isto é, toda a meninice que existia por detrás daquele embrutecimento causado pela miséria em que viviam: "Mas o carrossel girava com as crianças bem vestidas e aos poucos os olhos dos Capitães da Areia se voltaram para ele e estavam cheios de desejos de andar nos cavalos, de girar com as luzes. Eram crianças, sim - pensou o padre." (p. 73).

O segundo momento será quando a varíola ataca a cidade, matando um deles (Almiro): "E a varíola desceu para a cidade dos pobres e botou gente doente, botou negro cheio de chaga em cima da cama." (p. 133). Padre José Pedro tentando ajudá-los vai contra a lei e é chamado às falas pelo arcebispado.
Ruptura com certas convenções do romance tradicional
Já afirmou o prof. Álvaro Cardoso Gomes (em Roteiro de Leitura: Capitães da Areia, Ática, 1996) que Capitães da Areia é diferente dos demais romances de Jorge Amado não apenas por causa da temática, mas também em virtude de sua estruturasui generis.

A rigor, diz Álvaro Gomes, podemos dizer que o romance não tem propriamente um enredo, porque modernamente o autor preferiu a montagem de Capitães da Areia por meio de quadros mais ou menos independentes, ao invés da estrutura convencional em que há uma rigorosa organização dos fatos e relações causais entre os eventos narrados.

Visão paradoxalmente lírico-comunista
Jorge Amado é conhecido por ser um escritor que cria narradores que aderem às causas das personagens mais necessitadas, excluídas. Escolhendo essa forma de criar histórias, através de narradores que tomam partido pelos mais fracos, Jorge Amado, claramente, reflete os princípios ideológicos da esquerda, pois, conforme já afirmado anteriormente, na época em que escreveu o romance, o autor pertencia aos quadros do Partido Comunista. Dessa forma, o narrador, aqui, funciona como uma espécie de delegado do autor.

D'Onófrio (em Poemas e narrativas: estruturas, Duas Cidades, São Paulo, 1978) afirma que, na arte narrativa, o narrador nunca é o autor, mas um papel inventado pelo autor; é uma personagem de ficção em que o autor se metaformoseia. Mesmo nos casos limites, diz D'Onófrio, do uso da própria vida para fins artísticos, num poema ou num romance escrito em primeira pessoa e com a utilização de dados biográficos da pessoa do autor, quem nos dirige a palavra só pode ser um ser ficcional.

No caso do narrador de Capitães da Areia há muitos traços da personalidade de Jorge Amado, que, na época, era ativista político. No entanto, jamais poderíamos afirmar que o narrador é o próprio Jorge Amado. Sendo assim, a melhor forma de entender essa relação narrador-autor será a de delegação deste para com aquele.


Diálogo com o poema "Bandido Negro", de Castro Alves

O texto que segue abaixo é a epígrafe e as duas primeiras estrofes do poema "Bandido Negro" do poeta romântico, também baiano, Castro Alves:

BANDIDO NEGRO
Castro Alves

Corre, corre, sangue do cativo
Cai, cai, orvalho de sangue
Germina, cresce, colheita vingadora
A ti, segador a ti. Está madura
Aguça tua foice, aguça, aguça tua foice.

(E. SUE - Canto dos Filhos de Agar)

Trema a terra de susto aterrada...
Minha égua veloz, desgrenhada,
Negra, escura nas lapas voou.
Trema o céu ... ó ruína! ó desgraça!
Porque o negro bandido é quem passa,
Porque o negro bandido bradou:

Cai, orvalho de sangue do escravo,
Cai, orvalho na face do algoz.
Cresce, cresce, seara vermelha,
Cresce, cresce, vingança feroz.

Para os propósitos aqui estabelecidos, deteremo-nos apenas ao título: "Bandido", aqui, pode ser entendido como herói ao estilo Robin Hood, que é movido pela injustiça, por isso quer fazer justiça pelas próprias mãos. Já o adjetivo "Negro", propositalmente está sendo empregado pelo poeta de forma ambígua: tanto pode designar o negro cativo, quanto pode referir-se ao cavaleiro da vingança, que usa capa negra. A vingança, nesse caso, é uma realização tanto pessoal quanto social - e, para ser realizada, precisa de extensão narrativa (embora tenhamos extraído apenas as primeiras linhas do poema, devido ao nosso objetivo para essa aula, saiba que o poema é longo: contém 16 estrofes).

De forma análoga ao poeta romântico do século 19, seu conterrâneo, Jorge Amado, valendo-se de um tom poético, irá narrar em Capitães da Areia, se assim podemos dizer, a vingança desses jovens excluídos pela sociedade, abandonados à própria sorte. E aqui não são apenas os negros, outrora escravos (como no poema de Castro Alves), que se levantarão contra essa sociedade burguesa, mas também, os pobres, brancos e mestiços.

No poema de Castro Alves há uma espécie de desabafo das vozes escravas reprimidas, uma espécie de reivindicação por justiça, que é feita pelas próprias mãos do Bandido Negro, assim, também são os meninos do trapiche, que, num gesto de desabafo, clamam por justiça, por estarem à margem de uma sociedade que não os reconhece.

Por isso, partem para fazer justiça com as próprias mãos. Por isso, num plano mais geral, existe o conflito desses jovens com a sociedade, com o status quo, isto é, com a ordem estabelecida. E a forma de criar o conflito será roubando desta sociedade seu "sossego", praticando os mais diversos atos ilícitos, como roubar, estuprar etc.
Crítica impassível em torno de sua obra
Tida pela crítica como uma das criações ficcionistas mais populares do Brasil, a obra de Jorge Amado tem-se caracterizado, como já se disse, pela adesão afetiva do narrador aos fatos que relata. Normalmente, seus comentadores o opõem a Graciliano Ramos, que, no mesmo período, observou criticamente o real.

Um dos maiores problemas de Jorge Amado foi, segundo seus críticos, o de aceitar sem profundidade o universo psicológico de suas personagens. É nesse sentido que muitos classificam sua obra como fazendo parte de um populismo literário, inclusive seus romances de ênfase política e social, como é o caso de Capitães da Areia.

É nesse sentido que Alfredo Bosi afirma que o populismo literário (incluindo o de Jorge Amado) é uma mistura de equívocos, e o maior deles, diz Bosi, será por certo o de se passar por arte revolucionária.
Sentimento do mundo – Carlos Drummond de Andrade


Poeta, contista e cronista, Carlos Drummond de Andrade (Itabira, MG, 1902 - Rio de Janeiro, 1987) é um dos mais importantes escritores brasileiros. Publicado em 1940,Sentimento do mundo é um dos marcos em sua carreira pelo número de poemas de qualidade que reúne e por ser, em diversos aspectos, o retrato de uma época.
O livro, terceiro do poeta, traz 28 poemas produzidos entre 1935 e 1940. Os principais elementos em comum são o olhar crítico sobre a realidade circundante e um tom marcadamente político. O livro precisa ser contextualizado num período entre a 1a. (1914-18) e a 2a. Guerra Mundial (1939-1945), dominado pelo pessimismo.
O grande tema é uma experiência coletiva trágica da humanidade. Há uma necessidade de solidariedade social num momento em que predomina a capacidade da arte, por exemplo, de contribuir para uma sociedade mais justa e equilibrada em todos os seus traços.
O sentimento do poeta é de que a liberdade é essencial para a convivência harmoniosa entre as pessoas, terminando com qualquer tipo de preconceitos. O egoísmo, que teria sido fundamental na escolha dos caminhos dos combates armados, precisaria ceder espaço a novos valores.
A arte passa a ser vista como uma atividade conectada com o mundo e não como uma ação sem interação social. No lugar de uma espécie de válvula de escape de uma sociedade que lhe é adversa, os versos passariam a ter um papel determinante na comunicação entre as pessoas para defender ideias.
Existe a convicção de que os indivíduos podem mudar o mundo, mas não se pode confundir isso com excesso de otimismo. A revolução, a utopia, o amor e a comunhão entre todos encontram resistência no pessimismo de muitos e em valores arraigados baseados no egocentrismo.
Sofrimento e dor pela busca de um mundo ideal que não existe, aliados à esperança de que isso aconteça, dão o tom ao conjunto de textos. Nesse sentido, o futuro é apontado como uma possibilidade constante de redenção para um presente ainda conturbado.
Solidão e fragilidade são assuntos muito presentes nas páginas do livro. Há então críticas à burguesia e a um raciocínio regido por valores monetários. Nesse aspecto crítico, Drummond aproxima-se de Oswald de Andrade não tanto na forma, mas na maneira de conceber a sociedade capitalista como algo vazio de conteúdo.
Certos poemas merecem leitura atenta. “Menino chorando na noite” adota a criança como símbolo da vida; “Morro da Babilônia” apresenta o espaço da favela como uma mistura de horror e ternura; e “Congresso internacional do medo” coloca esse sentimento como dominador (“Provisoriamente não cantaremos o amor, que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos. Cantaremos o medo que esteriliza os abraços...”).
“Brinde no juízo final”, que homenageia os poetas populares contra os acadêmicos e defende que a poesia é feita tanto de assuntos e vocábulos nobres, como de palavras e fatos e reflexões cotidianos; e “Privilégio do mar”, ao alertar que aqueles, como ele mesmo, que, não atingidos pela miséria social, não se mobilizam e permanecem privilegiados e encastelados em suas moradias burguesas, são outros poemas importantes de um livro paradigmático na literatura brasileira do século XX.
Vidas Secas - Graciliano Ramos


Entre a excelente produção de Graciliano Ramos (1892 -1953), torna-se difícil escolher qual é o romance mais significativo. Eles se equivalem na economia de recursos, na denúncia social e na maneira de abordar dilemas existenciais a partir de situações cotidianas retratadas sem grandiloquência. Muito mais que denunciar o sistema opressor que humilha os nordestinos, o escritor alagoano é um mestre da palavra.

Boa parte da crítica, porém, quando questionada sobre a obra-prima de Graciliano, escolhe "Vidas Secas". Publicada em 1938, é considerada por muitos como o principal texto do autor por dois fatores essenciais: o retrato da sacrificada luta pela sobrevivência daqueles que sofrem com a seca no nordeste e a forma como essa história é contada, com capítulos que podem ser lidos fora de ordem com economia total de adjetivos.


Enredo

Fabiano e sua família, formada pela esposa Sinhá Vitória, pelos filhos não nomeados, chamados apenas de Menino mais Velho e Menino mais Novo, a cachorra (esta sim, batizada ironicamente de Baleia, ou seja aquela que anda livremente pelo mar) e o papagaio, têm a sua saga de migrantes narrada em terceira pessoa.


Ausência de comunicação

A estiagem que corrói a terra, levando à fome e à necessidade de migrar também domina a alma de cada um dos personagens. Eles não passam de marionetes de um grande sistema econômico do qual não conseguem escapulir e que os massacra sob diversos aspectos, da falta de dinheiro ao da carência total de perspectivas.

A ausência de comunicação entre os personagens é o grande tema do livro. Se a baleia, enquanto cetáceo, domina o mar, a Baleia do livro, adoentada, é vencida pela seca, sendo sacrificada por Fabiano, numa das principais cenas do livro, levada para a tela com extrema sensibilidade na versão cinematográfica de Nelson Pereira dos Santos, em 1963.

Mesmo na tarefa de matar Baleia, Fabiano fracassa. Apenas fere o animal, que vem a morrer no dia seguinte. O talento de Graciliano está em estruturar a narrativa de modo que, perante pessoas sem sonhos, apenas Baleia tem o poder de imaginar. Pouco antes de morrer, ela vê a si mesma num campo repleto de preás, onde poderia saciar a sua fome.


Recursos verbais

Resta à família de migrantes ter como ideal o paradigma idealizado de Tomás da bolandeira, com sua cama de couro e seu amplo vocabulário, que se tornam objetos de desejo da família de Fabiano. Sem educação, a família não tem sequer recursos verbais para discutir qualquer tipo de ofensa ou humilhação pela qual passa.

A representação do poder instituído está na personagem do Soldado Amarelo. Surge como um policial arbitrário que, após uma discussão num jogo de cartas, é responsável pela prisão e humilhação do chefe da família sertaneja, que se sente impotente perante o mundo, sem possibilidade de alterar nada.

O dono da fazenda abandonada em que Fabiano trabalha como vaqueiro também pode ser considerado uma representação da mediocridade, injustiça e opressão. Sua busca pela produtividade o deixa cego para qualquer valor humano. Em contrapartida, a família caminha num triste movimento cíclico de solidão, abandono das autoridades e desesperança. A única alternativa é a melancólica fuga, tanto de si mesmos como do sertão abrasador.








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